A Noite de Caça











A faca reluzia sob a luz alaranjada do poste em que Alex estava, o brilho no metal da arma parecia 
preenchê-la do fascínio voraz que seu dono possuía ao usá-la. A noite como sempre estava quente, o suor descia por seu pescoço e empapava suas costas, mas não o impedia de vestir uma camisa com casaco de capuz preto, calça jeans e tênis. Eram suas vestimentas sagradas para aquela noite, a noite em que o fio de sua lâmina ia mergulhar na carne de sua próxima vítima e escorrer o carmesim como a nascente de um rio, a noite em que ele se excitaria ao ouvir lamentos, súplicas e gritos de dor. A noite de caça.

A lua amarela brilhava cheia no céu como uma homenagem ao predador que esperava o ônibus das dez e meia parar no ponto a alguns metros dali. Sob aquela mesma lua, Alex se lembrava de como fora divertido espancar o mendigo no mês passado. O homem bêbado até tentou revidar, mas fora tão patético que só deixou o show ainda mais divertido, o jovem se lembrava com júbilo da euforia quando sua faca rasgou a carne do velho, derramando seu sangue no concreto e depois tacar fogo nele ainda vivo. O som dos gritos do mendigo ainda ecoavam na sua mente, como uma música agradável, que sempre trazia um sorriso no seu rosto. A única coisa que não o agradou foi o cheiro daquele homem imundo depois de queimado, um cheiro nauseabundo que demonstrou o quanto aquele miserável era podre e desprezível, como todas as suas vítimas.

Todos ratos que viviam nas costas da elite social, negros, pobres, gays e o resto dessa corja que denigria a sociedade, infestando o mundo de filhos sujos e criando ainda mais miséria. Se a pobreza existia era por causa dos pobres que continuavam a se proliferar, trazendo criminalidade e desigualdade, se amontoando em quilombos, invasões e periferias. Era por isso que Alex caçava, ele estava acima daqueles animais, o filho de uma família Alemã antiga e bem quista por qualquer um que a conhecia, seu pai como juiz lhe deu sempre uma boa educação que o mostrou desde cedo onde era seu lugar no mundo.

Aquela caçada era algo natural, assim como leões matavam hienas e gatos caçavam ratos. Os mais altos na hierarquia social possuíam o direito moral de dilacerar e controlar os inferiores, para que sua doença não afetasse ainda mais seu bom e grande país. Assim foi com o mendigo e assim foi com a prostituta travesti da semana passada. Naquela noite sem lua, com os trovões estourando junto com o ronronar do motor de sua picape, que parou em frente daquela aberração. Foi divertido ver seu rosto de alegria pensando que conseguiu um cliente, ainda mais ver o medo no seu rosto, os cortes vertendo sangue e suas tripas caindo quando ele rasgou da barriga até onde estava sua verdadeira natureza. Suas caçadas eram mais prazerosas que mil putas sujas e não tinha nada de errado, já que aquelas coisas nem poderiam ser consideradas seres humanos.

O som de latidos ecoaram ao fundo, em uma das várias ruas entrecortadas ali perto, uma confusão de cães estéricos agitados pela luz da lua. Cães, sempre escandalosos e inquietos, que só sabiam latir, comer e foder uns com os outros, uma alegoria perfeita as pessoas que contaminaram aquela linda cidade secular. Seus pensamentos foram interrompidos quando finalmente o ônibus das dez e meia parou, vindo direto do Campus da universidade federal lá em Bela Rosa. Alex esperou atento os passageiros descerem e lá avistou sua vítima.

Sua pele era cor de barro, só que mais escura e feia, o amontoado desgrenhado que eles chamavam de afro balançava como um bolo de matagal, as curvas bem proeminentes do seu corpo o atraíam, mas só era a prova que aquele tipo só servia para um tipo de coisa. Mulheres como aquela eram apenas satisfazedoras de desejos, objetos para extravasar as promiscuidades dos verdadeiros seres humanos. Ela chamou sua atenção dentro da própria universidade, local onde ele também estudava, no meio da aula de direito penal, aquela garota estava toda inflada, falando sobre a injustiça, sobre como vagabundos e marginais eram presos injustamente. A única injustiça que Alex via ali era que eles eram apenas presos e não executados de uma vez.

Sua presa seguiu com um grupo de amigos por uma rua de paralelepípedos, e então se separou deles, entrando em uma pequena ladeira de terra batida. Assim que viu que ela estava sozinha, Alex apertou seu passo tomando cuidado para ela não perceber que estava sendo seguida. A sua mão tremia perto da faca de tanta ansiedade, seus lábios estavam secos de tanta inquietação e a adrenalina provocava um começo de ereção. Para sua sorte, ela parecia facilitar o trabalho, seguindo por ruas cada vez mais escuras, com postes quebrados, e vários terrenos baldios por perto. Ele estava a menos de dez metros dela, quase sentindo o cheiro de seu suor naquela noite absurdamente quente, precisando se controlar para não andar rápido demais e ser percebido, aquela hora era crucial. Assim que ele se preparou para disparar, apertou faca com uma das mãos, mas antes do primeiro passo um barulho alto de latidos esganiçados surgiu forte no fundo da rua, como se dezenas de cães loucos estivessem se matando para comer uma fêmea. O barulho era tanto que fez a garota olhar para trás e perceber seu captor.

Malditos cachorros.

Assim que a garota viu o encapuzado, disparou e pôs se a gritar. Fazendo um escândalo no meio da rua vazia, para a sorte do jovem ninguém ouviu, ou se ouviu não se arriscou a sair. Mas ainda era um perigo que ele não queria correr, Alex disparou, colocando toda a força em suas pernas, a sua vítima até corria bem, mas a cada metro que ele ganhava de vantagem sua adrenalina crescia mais, se sentindo o próprio leão correndo na atrás de uma gazela, o rei daquela floresta de pedra. Ele a alcançou em poucos metros e usou o próprio peso para derrubá-la, os dois caíram na terra batida e ali mesmo já desferiu dois socos em sua face, ao ver a garota gemendo de dor ele puxou o ar para os pulmões e se pôs a levantar, segurando-a pelos cabelos.

Assim que ela tentou gritar um terceiro soco lhe atingiu o estômago e mais uma vez foi jogada ao chão. Recebendo chutes nas costelas e na cabeça, entre o intervalo dos golpes ela chorava e implorava pela vida, cuspindo sangue e dentes quebrados, mas aquilo só aumentava o prazer dele. No fundo da rua os cães, presos em suas casas, latiam cada vez mais alto, alguns eram histéricos e pareciam querer se matar, outros eram baixos e covardes e seus latidos saíam como ganidos.

- Isso! - Gritou Alex quando ficou em cima dela e lhe desferiu mais dois socos. - Sua vaca imunda!

Seus socos continuam a atingir o rosto da moça transformando-o em uma massa de hematomas, sangue caía dos arranhões e um dos olhos estava tão inchado que nem dava mais para vê-lo. Cada soco o fazia vibrar de furor, cada grito dela o estimulava como droga nenhuma pôde fazer, nada era comparado aquilo, a emoção de vitória, de total supremacia, ela o esquentava ainda mais e enviava toda aquela energia para sua pélvis. Assim que viu o corpo dela todo sujo, sua camisa justa rasgada em uma das alças a deixou mais excitante. Por culpa dela agora ele estava cheio de tesão e precisava extravasar.

- Você vem comigo! - Alex a puxou para cima, mas a garota mal conseguia se manter em pé, ele segurou por um dos braços, deixando a bolsa dela no chão.

O cheiro do sangue dela o provocava ainda mais, e ele sentia vontade de estuprá-la ali, mesmo, mas precisava esperar, enquanto seguiam pelas ruas escuras e vazias mais cães latiam no que parecia ser a rua de trás. Os malditos cães que o denunciaram, eles também teriam uma surpresa quando tudo aquilo acabasse. Enquanto caminhavam os gemidos da garota se transformavam em palavras que davam para entender.

- Por… Por favor… - As palavras saíam tão baixas que o fez se aproximar para ouvir. Ouvir aquilo colocou um sorriso no seu rosto.

- Se você for boazinha, talvez eu te solte. - Ele queria ver, o brilho de esperança emanando em seu único olho aberto. Queria ver ela se decepcionando depois de tudo, queria acompanhar bem seu sofrimento. A garota então voltou a falar.

- Por favor, me mata… Me mata… Me mata. - Aquelas palavras o encheram de fúria. Aquela miserável estava pedindo por uma misericórdia insana que nem ao menos merecia. Bem sua morte iria chegar sim, mas só na hora que ele quisesse, só depois de abusar daquele corpo, vivo enquanto sangrava, ou morto até. Para condenar de vez aquele ser imundo.

- Acha que eu obedeço animais! - Finalmente no mato onde não havia ninguém Alex a jogou no chão e deu dois chutes em seu estomago,

O golpe fez a vítima vomitar e gemer de dor, e ele tremer de prazer, então tira sua faca da bainha e a segura bem no pescoço dela. Os cachorros continuavam latindo ao fundo, mas nem isso o incomodava mais. Só o que atraía eram os seios enormes da garota, o medo em seu olhar e sua total submissão.

- Eu decido quando você morre! Não adiante pedir. - Com uma das mãos ele deixa a faca bem perto do pescoço dela enquanto a outra desabotoava o botão da calça jeans. A garota continuava gemendo o que deixava seu pau latejando de tanto tesão. Assim que metesse nela ia começar a esfaqueá-la, em lugares que já conhecia muito bem, para que a diversão pudesse demorar. O zíper é baixado devagarzinho, sua calcinha já podia ser vista, adrenalina e excitação se uniam em um estase na mente de Alex.

- Bom. - Uma voz surgiu atrás dele, grossa com tons animalescos, interrompendo seu grande momento.

Assim que ele olhou para trás, toda sua sensação de poder sumiu ao se deparar com uma figura que parecia ter saído das entranhas do inferno. Um corpo alto e peludo, barriga proeminente, mas com braços musculosos e mãos grandes com garras. A aberração caminhava sob duas pernas, mas estas eram grossas e arqueadas iguais a de um cão e seu rosto era ainda mais amedrontador. Os traços humanos se uniam com o formato canino que lembrava um rottweiller, sua boca larga exibia os dentes em um sorriso psicótico. A baba caia por entre os dentes. A bile subia pela garganta de Alex e suas pernas tremiam tanto que ele mal podia se mover, seus olhos não conseguiam olhar diretamente para a fera como uma tentativa falha de não assimilar o que acontecia. Num gesto súbito do desespero ele se levantou e empurrou a garota para frente.

- Ela! Pega ela! - vítima por sua vez mal conseguia reagir, apenas tremia esperando o seu fim nas mãos de qualquer um dos dois monstros. O cão se aproximou dela e a cheirou, Alex só precisava de uma brecha, assim que ele começasse a devorá-la ele correria como nunca correra em sua vida. Enquanto sua mente se prendia ao resto de sanidade que ainda existia, suas esperanças estavam se renovando, sabia que aquela besta horrível se contentaria com a negra e não faria nenhum mal a ele. Suas esperanças se fortaleciam a cada vez que via aquela besta cheirar a garota, mas morreram muito rápido quando, a fera voltou sua atenção para ele e disse:

- Fêmeas, não. Machos, sim. - O sorriso do monstro aumentou ainda mais, seus olhos brilhavam vermelhos, famintos e insanos – Machos, bom!

O medo dominou seu corpo como fogo ao mato seco assim que percebeu que o monstro esquecera da garota e começava a andar em sua direção. Em pleno ápice da sua vontade de viver tentou se virar para fugir, mas suas pernas bambearam de tanto tremer fazendo-o cair no mato baixo. Em toda sua vida sempre se viu como o ápice da cadeia social, acima de qualquer daqueles que ele considerava lixos mundanos, mas a besta a sua frente não reconhecia isso, ela não olhava regras ou sistemas, apenas o olhava com aquele desejo demoníaco no olhar.

- A garota! Pega o lixo seu animal maldito! - Reunindo todas suas forças, Alex tentou se levantar, mas foi sufocado pelo peso da criatura sob si, uma das patas segurou seu braço e de tão forte o quebrou sem o menor esforço, o jovem sentiu seus ossos se quebrando como galho seco e foi inundado de uma dor excruciante. - Não! Não! Por favor não!

Naquela situação as antigas suas crenças se perdiam como areias ao vento, mesmo ele que se achava acima de tantos outros agora estava ali, se mijando de medo diante um monstro maior e mais forte. Uma força horrenda que não respeitava a ordem social, ou qualquer regra inventada pelo homem, porque não era nem humana. A besta farejava suas costas e só de sentir o bafo quente junto com a saliva da criatura em seu corpo o medo fazia seus órgão parecerem ter sido liquefeitos dentro dele.

- Bom… Bom… BOM!! - Envolta de um furor selvagem o monstro mordeu seu ombro, rasgando sua carne e quebrando seus ossos como se não fosse nada. O sangue vertia como um rio vermelho e a dor parecia levá-lo a um estado de inconsciência, quando uma nova sensação o trouxe de volta para um terror ainda maior.

Com um puxão, a besta ensandecida rasgou as suas calças, ao sentir o que ia acontecer Alex puxa a vegetação a sua frente, tenta reunir forças, mas estava totalmente rendido perante o demônio opressor. Medo, desespero e vergonha; qualquer soberba que antes existia fora trocada pela loucura abissal, o desespero e a tristeza, da sua boca saiam lamentos e súplicas que ninguém ali ouviria. Sua visão era turva devido as lágrimas que saíam torrencialmente. Não havia esperança para o que estava prestes a acontecer.

Ele sentiu, algo duro, quente e enorme por trás roçando pelas bordas do seu anus. Não se atrevia a olhar para trás, mas conseguia ouvir um urro louco e excitado vindo do mesmo lugar por onde caía a baba. Quanto mais a fera se animava para violá-lo mais ela o machucava, esmagando suas costelas com o peso da mão esquerda que o prendia pelas costas, arrancando seu braço só de apertar a mão direita envolta dele.


Ali do lado, a jovem, antes catatônica, começou a sair daquele estado, a medida que sua consciência voltava a dor pelo seu corpo se intensificava, mas mesmo assim sabia o que precisava fazer. Primeiro sustentou-se com um dos braços e depois puxoo ar para os seus pulmões, apreciando ali a gratificação de ainda estar viva, mas assim que se virou viu a aberração que segurava seu captor prestes a estuprá-lo. Seu primeiro impulso foi o de gritar, mas ela conseguiu suprimir, agora que tinha uma chance de se salvar não queria desperdiçá-la. Lentamente, se afastou tentando fazer o mínimo de barulho possível. Enquanto as súplicas do seu espancador viravam gritos de dor junto com o som de carne rasgando e ossos quebrando. Era horrível, grotesco, mas ela não se importava, depois do que passou, qualquer coisa que acontecesse a ele seria bem justificada.

Assim que se afastou o suficiente para se sentir segura ela começou a correr. Mesmo com o corpo cheio de dores, mesmo chocada com o que vira, suas pernas se moviam com agilidade, pressionadas por sua vontade de viver, passando pelas ruas estreitas e mal iluminadas, completamente vazias, com cada pessoa cuidando de sua própria vida. O alívio chegou quando ela entrou na esquina que dava para sua rua. A simples ideia de olhar para atrás a enchia de horror, só de imaginar que aquela monstruosidade tinha se saciado com o maldito e ansiava por mais.

Para sua felicidade, ou preocupação, seus familiares estavam na porta todos preocupados com a demora dela para voltar da faculdade, ver seus pais, seus tios e primos ali foi o sopro que ela precisava. O alívio final de que ela havia escapado de uma tragédia evitada por uma criatura vinda de seus pesadelos. O alívio foi tanto que baixou sua adrenalina e antes mesmo de chegar peto deles ela apagou, afundando em um sono sem sonhos.

...


Quando enfim acordou, não encontrou o seu quarto e sim paredes brancas de um hospital. Todo o seu corpo doía e vários curativos preenchiam seus braços, rosto e costela, seu olho esquerdo ainda estava fechado. Mesmo com tantas dores a melhor coisa era de saber que estava viva, que escapara de um monstro, uma criatura perversa que a atacou por pura e simples maldade. Aquilo a fazia chorar, chorar por ter sobrevivido, chorar por saber que outras pessoas iguais a ela passam pela mesma coisa, por puro ódio, preconceito e sadismo; chorar por saber que nem sempre elas tinham a mesma sorte de ter um monstro para salvá-las de outro monstro.

Sua mãe, que dormia em uma cadeira ao lado acordou e a acolheu com o calor de um abraço que só uma mãe poderia dar. Depois disso ela passou a manhã toda no hospital quando um homem bateu em sua porta.

Parecia ter mais que quarenta anos, seus cabelos grisalhos se amontoavam na cabeça e na barba, a barriga proeminente a fez lembrar da noite passada e a bile subiu pelo seu pescoço, mas sua mãe pareceu ter percebido e segurou em sua mão.

- Senhorita Joice Moura da Silva? - Disse o homem se aproximando e exibindo um distintivo. - Eu sou o delegado Luiz Macedo, queria fazer umas perguntas sobre o que a pessoa que te atacou. - O delegado falava em um tom gentil e amigável e pareceu ter percebido a inquietação dela e se manteve perto da porta.

- Si-sim. - Joice respondeu olhando apenas para baixo, tentando ao máximo afastar os pensamentos da noite passada, acontecimentos que ainda a atormentava. Mas precisava fazer isso, precisava denunciar o que tinha acontecido. - Eu estava voltando da faculdade, quando um homem me… me ata… - Era forte demais, as cenas os momentos, a dor de cada golpe parecia vir direto, fazendo sentir o mesmo medo de antes, o medo e a vergonha, mesmo tentando segurá-las suas lágrimas não paravam de cair.

- Olha, eu sei que foi um grande trauma. - O delegado se permitiu uma aproximação sentando mais perto da cama dela, só que deixando a mãe entre os dois. - Não precisa fazer isso agora, nós ouvimos relatos de testemunhas do seu ataque. Já temos dados suficientes e não precisamos de um depoimento detalhado, apenas uma confirmação. - Ao dizer isso ele tirou uma foto do bolso, mostrando a foto de um jovem branco, cabelos lisos e loiros, com olhos azuis como uma piscina. Os mesmos olhos que a olhavam com fúria enquanto ele a espancava, a mesma boca que sorria vendo ela gritar. - Foi esse o homem que a atacou?

- Sim… - Depois disso ela não conseguiu falar mais nada, além de chorar nos braços da mãe até pegar no sono, querendo esquecer de tudo que passou, querendo que tudo aquilo fosse apenas um pesadelo, mas não era. Era real e a acompanharia pelo resto de sua vida.



Ver aquela cena apertou o coração do delegado como sempre acontecia em casos assim, seu peito apertava de tristeza enquanto sua mente fervilhava de fúria pelo que começou a acontecer naquela cidade. Luiz saiu do quarto da moça agradecendo, mas quando se virou para sair dali deu de cara com o pai dela. Um homem com um semblante melancólico e ao mesmo tempo colérico, vestindo roupas simples como o homem simples que era. As marcas de sol em seu rosto mostravam os anos que aquele homem trabalhou sob o sol para dar um futuro para seus filhos, e coisas assim ainda aconteciam.

- Diga doutô – Disse o pai, com a cólera engasgada na garganta. - Vocês vão pegar o maldito que fez isso não vão?

- Senhor… - A mente do delegado se embaralhava ainda o se lembrar do que descobriu ainda naquela manhã.

- Silva, José da Silva. - Respondeu, com firmeza.

- Seu José. Isso não vai ser necessário, quando apuramos o depoimento das testemunhas chegamos a um local onde encontramos o corpo do suspeito. - Ele percebeu que o homem ia se pronunciar em defesa da filha, mas já interrompeu falando – Fique tranquilo, seu José. As provas mostraram que foi um ataque de animal. Já houve outros casos de ataques assim, aparentemente alguma onça anda pelas redondezas e talvez atacou o suspeito quando ele ia atacá-la.

- Olha doutô, você me desculpe, mas bem feito então e abençoada seja essa onça, que decidiu levar um filho da puta covarde do que minha pobre filha. Agora com sua licença – Assim que ouviu aquilo o delegado acompanhou com o olhar o velho ir em direção ao quarto da filha.

Quando saiu do hospital ele puxou um maço de cigarro e ali mesmo acendeu com seu isqueiro, a tragada foi profunda e conforme a nicotina infetava seus pulmões sua mente ficava mais leve, arejada e seus dedos pararam de tremer. Mesmo depois de meses de sobriedade os eventos daquela cidade lhe trouxeram tremores tão horríveis que o forçaram a voltar a buscar o refúgio da nicotina. Com o cigarro na boca o delegado caminhou até o estacionamento do hospital, lembrando do corpo que encontrou naquela manhã. Seria um problema com o canalha do Juiz pai dele, mas graças a faltas de prova encerrou o caso como ataque de animal. Era a forma mais simples de fechar aquela história e para ele até que necessária, para esconder o que tenha sido a causa verdadeira. A forma que o corpo foi encontrado mostrara que tinha sido algo bem pior, uma coisa horrenda que se escondia nas noites e vielas escuras.

O garoto foi encontrado com ambos os braços estraçalhados, mordidas que arrancaram pedaços de carne e ossos; as costelas esmagadas e as pernas esticadas com uma abertura violenta no anus, que dilacerou suas nádegas e estraçalhou a metade inferior da coluna. A cabeça fora encontrada metros a frente com parte da coluna ainda presa, como se fosse arrancada na pura força bruta.

Mesmo já presenciado várias cenas de crime, a imagem do corpo ficaria para sempre cravada em sua mente. Mesmo sabendo que aquilo tinha acabado com um lixo covarde que não merecia qualquer pena, Luiz sabia que seja o que for que se escondesse nas noites, continuaria caçando, a procura da próxima vítima.


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